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18 março, 2007

Ei você, me dá uma ajuda?

A corda [sempre] arrebenta do lado mais fraco.

Moradores das proximidades do local, onde caiu o avião da Bahia Táxi Aéreo, contendo mais de R$5 milhões, estão sofrendo as conseqüências da infeliz sorte. Não bastassem os supostos policiais que tiraram uma parte do dinheiro das mãos de alguns [conforme relatou um rapaz na TV], agora, temem a chegada de grupos armados em busca de uma “ponta”. Uma fazenda foi invadida e assaltada. Os bandidos levaram a televisão, jóias, o rádio e até uma espingarda, conforme matéria do A TARDE On-line, neste sábado.

O dinheirão motiva diversos debates nas rodas de amigos, no trabalho e na rua. O dialogo é mais ou menos assim.

– E aí, o que você faria se estivesse próximo ao local do acidente?

– Oxi, pegaria logo um bolinho daquele pra mim.

Ou então:

– Rapaz, você viu o bolão de dinheiro?

– e não vi não foi.

– Os caras estão devolvendo o que pegaram. Devem estar com medo de represálias.

– Que porra nenhuma, eles são é burros. Aaah eu lá, queria ver eu devolver. Entocava logo um bolo daqueles. Um bolo daqueles... um só meu deus.

Outras formas de relatar o assunto aparecem, mudam-se as palavras, permanece o teor. Ninguém sequer lembra das pessoas mortas no acidente. Talvez, apenas os familiares.

NO BUZÚ, SÁBADO À TARDE.

O ônibus é da empresa Dois de Julho. A linha: Terminal da França - Vila de Abrantes [número 047]. Sentido Abrantes, por volta das 17h.

Estava com a minha meninota. Íamos devolver uns filmes alugados no Shopping Estrada do Côco. Ela pediu para mudarmos para a cadeira alta, com braço. Antes de alcançarmos a cadeira, outra menina apressadamente sentou. Resolvi sentar no penúltimo banco, lá atrás. Acredito que o rapaz tinha descido a pouco, no primeiro ponto da Avenida Dorival Caymmi. Quando vi o dinheiro, junto com a ‘pata-pata’ [aquele pente para cabelo crespo], não havia como devolvê-lo. Devia ter mais de R$50, não contei. Uma nota de vinte, algumas de dez e uma de cinco. Senti um frio na barriga. Antes que qualquer pensamento maligno aparecesse em minha cabeça, levantei-me e entreguei tudo ao cobrador. [- Algum passageiro deixou cair isso aqui]. Troquei de lugar, sentei atrás do vidro, de frente para o lado da cadeira dele. Percebi quando ele – cabelos pretos e óculos arredondados – colocou o dinheiro na sacola.

Muitos vão me condenar por não ter ficado com a grana. No entanto, prefiro os poucos que entenderão minha atitude. Esse dinheiro não me deixaria mais rico, não pagaria minhas dívidas, não me traria felicidade. Já perdi dinheiro [muito mais do que tinha ali], sei como é ruim, doloroso, angustiante. Sei que não vou mudar o mundo [sou apenas um beija-flor apagando incêndios com gotículas de água], mas, não quero me render a ele. Não quero ser cúmplice desse mundo, dessa humanidade perdida, desse sistema escroto. Quero viver fazendo o bem. Quero ir melhorando a cada instante, corrigindo minhas imperfeições. Quero me livrar dessa materialidade doentia. Preciso da sua ajuda.

12 comentários:

Filho disse...

Compreendo a sua atitude. É estranho como virou regra vc ter de se dar bem a custa do sofrimento dos outros, se vc não se aproveita de determinadas situações vc é otário entre outras coisas. É triste e o problema é muito maior do que o que vc abordou. Existem relações cristalizadas na sociedade que se firmam justamente em comportamentos com este e ninguém da a mínima.
Abraços.

Guigus disse...

pois é... as pessoas exigem mudanças, reclamam da safadeza dos políticos, mas não enxergam a natureza de tais comportamentos. "Como cobrar algo se faço a mesma coisa?" Mudam-se as proporções, o âmbito; mas permanece o desvio moral. O "crime" é igualzinho e também não tem punição.

Anônimo disse...

é sempre bom acompanhar o talento de cara !!

Parabéns Guigo..smepre ve4nho ver seu blogger e vc esta dando um show !

Abração

Deno

Anônimo disse...

Ainda há honestidade... sabe que defendo a idéia de que a maioria das pessoas é muito honesta? A mídia é que deturpa tudo.

Um abraço

Filho disse...

Oi, cara. Faço jornalismo nas FJA.
Quanto ao que Alena falou, realmente na mídia tudo parece bem pior do que realmente é. Mas, não precisamos dela pra vermos que há uma deturpação constante dos valores. É regra geral: todo mundo quer se dar bem, muitas vezes não importando como. Abençoadas sejam as pessoas que levam uma vida digna, as que são honestas e as criancinhas, pois delas é o Reino dos Céus.
Abraços

Guigus disse...

Respondendo:
Adenor, você é sempre bem-vindo! Continue aparecendo, espero ter competência para surpreendê-lo a cada visita.

Alena, também acredito em tal idéia. Mas me preocupo com as atitudes pequenas do dia-a-dia. Os pequenos e inocentes desvios...

Panis:então somos colegas!!

Hieros Vasconcelos disse...

Uma ressalva: foram quatro mortos no acidente do Bata Bahia tàxi Aéreo.
E achar uma carteira com R$50 reais é muito, mais muito diferente de encontrar uma sacola com 100 ou 500 mil reais. Analise a situação daquelas pessoas. Não há porque julgar as pessoas que,após anos de dor, sofrimento, pobreza e fome, veem chances que caíram do céu.
"Eu vou pra Maracangalha eu vou..." É a vida dos oprimidos. É o cruel retrato de nossa realidade.

Anônimo disse...

"..com meu chapéu de palha eu vou.."
Admiro sua posição, atitudes como esta estão ficando cada vez mais raras. Se é para apagar o fogo da desonestidade e todos q vem junto com este, me inclua no movimento beija flor. As pessoas reclamam de muita coisa dos políticos realmente. É preciso exigir, mas que exemplo é este q esta exigindo? Pequenos situações de safadeza que colaborão ainda mais para um mundo de desigualdade e desonestidade..A situação deles é realmente outra..mais há várias histórias de pessoas como eles q tiveram a msm posição q a sua..eu realmente dou valor..Q Deus abençoe..e q a situação seja invertida..ou pelo menos melhore..eu estarei junto na luta, não apenas de palavras, muito menos reclamações..mas atitudes e comportamentos..

Guigus disse...

Caro amigo blogueiro. Hieros.

preferi responder o seu comentário aqui, para ter certeza que vc ia ler.
Percebo que está bem informado sobre o acidente, mas que não compreendeu o que falei. Em momento algum julgo aqueles oprimidos (de anos de sofrimento, pobreza e fome). Eu os defendo. Começo o texto dizendo que a corda arrebenta do lado do mais fraco. Quem são os mais fracos? Citei a situação que eles estão vivendo. Ameaçados por supostos policiais e assaltados por grupos armados...
Com relação a carteira, tinha mais de R$50 com certeza. A diferença sabe qual é? Quando pedi desligamento do emprego, recebi "meus tempos". Após pagar contas e comprar coisas necessárias fui para faculdade com uma parte do que restou. Eram mais de R$200, dinheiro que seria utilizado para o mercado de minha filha, então com 3 anos. Minha carteira caiu dentro da faculdade, nunca mais vi... Não desejo o que passei para ninguém e não farei ninguém passar por isso.
Obrigado, abraços e vamos continuar dialogando!!!!

Guigus disse...

Liu,
Movimento Beija-flor!!! Legal!!! Realmente as atitudes do dia-a-dia são essenciais, elas irão mostrar quem é conivente ou não com certas situações, como o "jeitinho brasileiro".

Hieros Vasconcelos disse...

Fiz uma simples comparação entre os dois fatos: achatr uma carteira de 50 reais em um ônibus, por uma pessoa com condições financeiras... nada mais se espera do que a devolução dela...
Mas, quando se tratam de milhões, em um local como "Maracangalhas"... enfim,
continuemos a dialogar.
abs
Hieros

Guigus disse...

Perfeito, mas o problema não é o local [Maracangalhas]ou as pessoas pobres e sofridas. Elas estão sendo vítimas de outras pessoas, que estão indo lá, ameaçando-as, para botar a mão em alguns mil ou milhões.